Afinal, o que é a adolescência?

Afinal, o que é a adolescência?
A palavra vem do latim adolescentia, que significa período entre a infância e a fase adulta. Alguns pesquisadores a define como uma fase natural da vida marcada por mudanças fisiológicas e comportamentais. Outros vão considerá-la como uma construção social e histórica, como a psicóloga Ana Bock, em seu artigo “Adolescência como uma construção social”.
No que diz respeito à duração da tão falada fase, a Organização Mundial de Saúde (OMS) determina que o período inicia aos 10 anos e termina aos 19. Além disso, a agência divide a adolescência em três fases:
● Pré-adolescência – dos 10 aos 14 anos
● Adolescência – dos 15 aos 19 anos
● Juventude – dos 15 aos 24 anos
No Brasil, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) a adolescência vai dos 12 aos 18 anos de idade, sendo inclusive esta a referência para criação de leis e programas voltados para essa população.
Enfim, são muitas as definições desenvolvidas por estudiosos das mais variadas áreas de conhecimento, dentre elas, a psicologia, a medicina, a educação e a filosofia. Por aí, já dá para perceber que não podemos reduzir este período tão complexo do desenvolvimento humano a meras características, afinal, quando o assunto é ser humano, nada é tão simples.
A noção de construção histórica do conceito de adolescência é fundamental, pois permite olhar para a fase de um novo prisma. É este olhar que possibilita desconstruir a visão de adolescência que nos foi ensinada, aquela em que o adolescente é um ser em crise, e, por isso mesmo, comumente rotulado como “aborrecente”.
É a partir desse olhar ampliado que a terapia na adolescência deve ser conduzida, a fim de contribuir para a construção de outra relação com seus viventes, de modo que lhes facilite, efetivamente, vislumbrar novas possibilidades de experiências e comportamentos. Afinal de contas, os adolescentes são sujeitos de direitos e responsabilidades, como assegura o ECA, mas também de desejos.
Quem é o adolescente?
Contardo Calligaris, em seu livro A Adolescência, começa a definir o sujeito adolescente como alguém:
● que teve tempo de assimilar os valores mais importantes da comunidade em que se insere (no nosso caso, um valor seria o sucesso social/ financeiro/ amoroso/ sexual);
● que atingiu a maturidade corporal para se dedicar às atividades que lhe são indicadas por esses valores;
● para quem é, justamente neste momento, imposto uma moratória, isto é, uma espécie de prorrogação para a entrada na vida adulta.
Por anos a fio o adolescente é treinado — pelos pais, pela escola, pela mídia etc — para adotar os ideais de sua comunidade. Porém, apesar de sua mente e corpo estarem preparados para entrar no “jogo” dos adultos e nele competir, esta mesma comunidade não o reconhece como adulto “suficiente” para tal.
Serão necessários mais uns bons anos para que finalmente lhe seja dado autorização para realizar os ditos valores. A validação é então postergada, e é esse tempo de suspensão que Calligaris (2000) define como adolescência.
"Aborrecente", rebelde sem causa... Será?
Esse adiamento já seria de cara razão suficiente para que essa época da vida fosse um tanto inquietante. Afinal, logo quando se sente preparado para o jogo, a participação nele lhe é negada, visto que não é admitido como adulto pela própria comunidade responsável por sua formação.
Além disso, na sociedade moderna, há um ideal acima de qualquer outro: a independência. Em nossa cultura, o indivíduo será reconhecido como adulto mediante sua afirmação como independente — como os adultos alegam ser. No entanto, tendo sua autonomia reprimida, sua vida é, em parte, deixada para mais tarde.
E quanto à imaturidade dos adolescentes?
A idéia de que a despeito da maturação do corpo, faltaria ao adolescente maturidade é problemática, pois a espera que lhe é imposta é justamente o que o mantém imaturo. A suposta rebeldia parece, portanto, ter uma causa: ao sujeito adolescente é inevitável perceber a contradição entre o ideal de independência e a manutenção de sua dependência imposta pela moratória
A IDEALIZAÇÃO DA ADOLESCÊNCIA
"Mas você só tem que estudar..."
"Ah, eu na sua idade fazia e acontecia..."
Vale ressaltar ainda uma contradição no modo como a sociedade idealiza a adolescência como um tempo de particular felicidade. Mas se não há autonomia, como pode a mesma sociedade imaginar que a fase é especialmente feliz? “A idealização social da adolescência ordena ao adolescente que seja feliz!”, afirma Calligaris (2000, p. 18).
A passagem para a vida adulta é, portanto, na maioria das vezes, marcada por falta de reconhecimento e autonomia. Em outras palavras, pela incompreensão dos adultos que tanto a idealizam como se lá nunca estivessem estado, desconhecendo assim seus percalços
Quanto tempo dura a adolescência?
Se a adolescência se apresenta como uma confusa fase de transição, igualmente complicada será a tentativa de estipular seu tempo de duração. Quanto ao seu começo, conseguimos mais facilmente demarcá-lo devido às mudanças fisiológicas que vêm com a puberdade, com o amadurecimento dos órgãos sexuais, por exemplo. Mesmo assim, as teorias se esbarram.
Alguns dirão que a adolescência se inicia um pouco antes da puberdade propriamente dita, quando já se notaria a aquisição de comportamentos de adolescentes mais velhos. Outros afirmarão que ela ocorre alguns meses depois.
O fato é que, de qualquer modo, a puberdade marca o início das mudanças. Mudanças estas consideráveis, verdade seja dita. Uma delas sendo a adaptação, entre outras coisas, à própria imagem que não é mais a mesma. É quando o adolescente passa a lidar também com a identificação de seus desejos sexuais e com a descoberta de que pode enfrentar os adultos.
Tudo isso pode parecer apavorante, inclusive para os adultos (pais, avós, professores entre outros), no entanto, apenas se transformará em um problema na medida em que o olhar dos mesmos, alerta Calligaris (2000), não confirmar nessas mudanças a passagem para a vida adulta.
Não surpreende que diante da espera imposta ao adolescente para fazer parte da vida adulta, não lhe reste muito mais que elocubrar: “O que esperam de mim?”
O que se espera de um adolescente?
Insegurança
O sujeito adolescente sabe que está diferente. Não vê mais no espelho a criança que um dia foi, nem tampouco, um adulto. “O que é afinal?”, indaga a si mesmo. Semelhante pergunta se fazem os adultos.
“Entre a criança que se foi e o adulto que ainda não chega, o espelho do adolescente é frequentemente vazio.” Calligaris (2000, p. 25)
Sem o olhar apaixonado do qual parecia merecedor na infância e sem aquele que deveria enxergá-lo como igual, a insegurança se torna um traço comum na adolescência.
Interpretar os adultos
“Mas o que querem os adultos?”, busca desesperadamente entender. A questão é que os adultos se contradizem. Talvez nem eles mesmos saibam o que querem. Negam a maturação do corpo outrora infantil, mas pedem — quando não imploram — que continue criança. Querem que se comporte como adulto, mas logo lhe recordam que não passa de uma criança. Cabe assim interpretar — ou mesmo, adivinhar — o desejo dos adultos.
Mas qual é o seu desejo? Quem quer saber?
O maior anseio do sujeito adolescente é tornar-se adulto. Deseja ser autenticado como tal para assim poder fazer parte deste mundo novo proibido que se lhe apresenta. Se a adolescência é uma interpretação de sonhos adultos, os adolescentes tratarão de encontrar as mais diversas compreensões. Assim, diversas também serão as suas condutas, tão quanto forem os sonhos e desejos reprimidos dos adultos.
Por esta razão, seus comportamentos podem parecer transgressores, visto que transgridem a vontade manifesta dos adultos. O comportamento adolescente é, portanto, considerado estranho ou anormal por parecer violador, se comparado ao tido como normal ou padrão do adulto.
A adolescência como ideal cultural
O peso da adolescência está em encontrar uma escolha que não seja relacionada à realização dos sonhos dos adultos, mas será que a adolescência não surge, justamente, porque os adultos precisam dela como ideal?
Paradoxalmente, esperamos que os adolescentes sejam felizes e dispostos, que se preparem fervorosamente para que alcancem tudo que nós não alcançamos, isto é, que realizem, em alguma medida, nossos sonhos frustrados. A transmissão dessa árdua tarefa é profundamente sentida, até mais que as alterações corporais.
Quanto mais a adolescência é encarregada de preparar o futuro, isto é, de alcançar um sucesso que faltou aos adultos, tanto mais ela se prolonga.
Conclusão
Aos poucos, os adultos percebem que as crianças que estão preparando já estão crescidinhas... É quando se esforçam no sentido de mantê-las protegidas no mundo encantado da infância, sem maiores responsabilidades ou obrigações. Mundo este parecido com aquele das férias tão sonhadas pelos adultos durante o ano todo.
Nesta perspectiva, tornar-se adulto não significaria nenhuma promoção em especial, visto que a adolescência é, de certa forma, um ideal dos adultos, que, sem recordar bem como foi a sua própria, insistem em vê-la como um tempo de suposta liberdade. Algo como umas férias mesmo, em que podem ser adultos no que diz respeito aos prazeres, mas sem as obrigações pertinentes.
“Moral da história: o dever do jovem é envelhecer. Suma sabedoria. Mas o que acontece quando a aspiração dos adultos é manifestamente a de rejuvenescer?” Calligaris (2000, p. 39)
O texto levanta importantes questões comuns aos adolescentes em geral, mas cada sujeito terá suas próprias e, por isso, a possibilidade de encontrar suas respostas particulares. São as suas perguntas e respostas, facilitadas pelo espaço terapêutico, que conduzirão rumo à autonomia de uma vida que lhes faça sentido para assim ser plena.
Referências
CALLIGARIS, C. A Adolescência. São Paulo: Publifolha, 2000.
BOCK, A. A adolescência como construção social: estudo sobre livros destinados a pais e educadores. 2007.
Sobre mim
Em minha longa jornada na Educação, conheci — e sigo conhecendo — adolescentes e jovens inspiradores. Foram eles que despertaram em mim o desejo de buscar compreender a complexidade humana, tão efervescente quanto encantadora nesta fase da vida. Conquistei, assim, minha segunda graduação em Psicologia e realizo atendimentos a adolescentes e adultos, nas modalidades presencial e online.
Experiência profissional
Especialista em Psicologia Clínica - NUCAFE
Especialista em Psicopedagogia - IBMR-RJ (Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação)
Graduação em Psicologia - USU-RJ (Universidade Santa Úrsula)
Formação em Mediação de Conflitos Escolares - SEMED (Secretaria Municipal de Educação de Macaé)
Formação em Educação, Drogas e Saúde nas Escolas - Fundação CECIERJ (Centro de Ciências e Educação Superior do Estado do Rio de Janeiro)
Formação em Interfaces do Suicídio - CEPUERJ (Centro de Produção da Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
Graduação em Letras - USU-RJ (Universidade Santa Úrsula)
Especialista em Língua Inglesa - PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro)
Atuação no Projeto Despertar - Núcleo de Assistência à Saúde Mental Casa Verde - Botafogo-RJ
Atuação junto aos casos de pessoas portadoras de transtorno mental usuárias de álcool e outras drogas.

Perguntas Frequentes
Algumas das perguntas mais comuns que recebo...
Qual o valor da sessão?
O Código de Ética Profissional do Psicólogo (art.20) não permite a divulgação de valores. Entre em contato para saber mais.
Posso utilizar plano de saúde?
Os atendimentos são realizados somente de forma particular.
Quanto tempo dura o tratamento?
Não podemos determinar um tempo fixo para a terapia, pois é preciso respeitar as singularidades pessoais. Além disso, o tempo varia conforme a demanda, a frequência nas sessões e o vínculo terapêutico.
Qual a periodicidade das sessões?
Os atendimentos duram em média 50 minutos e ocorrem uma vez por semana em horário fixo. A frequência semanal é fundamental para a construção de um bom vínculo terapêutico.
Sou menor de idade, como devo fazer?
O primeiro passo é conversar com seus responsáveis e pedir que entrem em contato e deem o ok para agendarmos uma primeira conversa. Ali, vamos nos conhecer, e antes da primeira sessão, um dos responsáveis assina uma autorização e já podemos começar.
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